Gabriel Renan da Silva Soares foi morto a tiros em 3 de novembro do ano passado. Um mês após o crime, com a divulgação das imagens, Vinicius de Lima Britto foi preso. PM atira em jovem que furtava sabão de mercado pelas costas
Reprodução
O policial militar Vinicius de Lima Britto, que executou um jovem negro em frente a um mercado da rede Oxxo na Zona Sul de São Paulo em 3 de novembro, vai passar pela primeira audiência de instrução nesta quarta-feira (29). A Justiça vai decidir se Vinicius vai a júri popular pelo homicídio.
Imagens de câmeras de segurança, obtidas pelo g1, registraram o policial atirando pelas costas de Gabriel Renan da Silva Soares, após furtar quatro pacotes de sabão líquido, e chocaram o país (veja imagem abaixo).
A audiência vai acontecer no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste da capital, a partir das 13h30.
Segundo o Tribunal de Justiça, a expectativa é que sejam ouvidas seis testemunhas de acusação e duas de defesa, incluindo o atendente do mercado — que presenciou o crime e é considerado peça fundamental da defesa.
Desde 5 de dezembro, o policial está preso preventivamente no Presídio Romão Gomes, na Zona Norte da capital.
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Jovem negro de 26 anos é executado por policial militar de folga em mercado de SP
Como foi o crime
Na noite de 3 de novembro do ano passado, Gabriel entrou no mercado da rede Oxxo na Avenida Cupecê, no bairro Jardim Prudência, vestindo um moletom vermelho com capuz.
Em seguida, ele andou até a seção de limpeza, onde pegou quatro pacotes de sabão. Na fuga, ele escorregou num pedaço de papelão na porta do estabelecimento e caiu no chão do estacionamento.
O policial estava no caixa pagando pelas compras, quando percebeu a ação. Vinicius sacou a arma e atirou várias vezes pelas costas de Gabriel, que tentava fugir. O jovem morreu no chão do estacionamento. Segundo o boletim de ocorrência, foram encontradas 11 perfurações pelo corpo dele.
No depoimento na delegacia, o PM disse que Gabriel estava armado e com a mão no bolso do moletom, razão pela qual ele atirou. Vinicius alegou que agiu em legítima defesa. Contudo, não é o que as imagens mostram.
No pedido de prisão feito à Justiça, a Promotoria argumentou o PM “praticou homicídio qualificado” e “efetuou diversos disparos contra a vítima pelas costas, que estava completamente desarmada e indefesa. Indicando, portanto, dolo exacerbado e brutalidade na prática do delito por ele intentado”.
A Promotoria considerou o motivo do crime fútil por ter reagido de forma desproporcional ao furto de produtos de limpeza, além de o PM ter usado um meio que impossibilitou a defesa da vítima e ter colocado outras pessoas em risco, uma vez que fez os disparos na rua.
Reprovado em teste psicológico
O policial foi reprovado no exame psicológico do concurso da Polícia Militar em 2021, quando tentou ingressar na corporação pela primeira vez.
Segundo o resultado da avaliação, Vinicius apresentou “inadequação” aos critérios exigidos no perfil psicológico para o cargo de soldado nos seguintes requisitos:
relacionamento interpessoal adequado;
capacidade de liderança;
controle emocional.
A informação foi divulgada inicialmente pelo site “O Joio e O Trigo” e confirmada por fontes do g1 e da GloboNews.
A avaliação psicológica é um critério eliminatório e realizada por uma banca examinadora. Após ser reprovado, Vinicius entrou com uma liminar contra a Fazenda Pública de São Paulo para contestar o resultado.
A defesa do PM, formada pelos advogados Carol Marques Mendes e Victor Varvello, explicou que Vinicius procurou tratamento com psicólogo particular após ser reprovado.
Cerca de três meses após a extinção do processo, Vinicius foi aprovado em um segundo concurso para soldado da Polícia Militar, em novembro de 2022.
Gabriel Renan da Silva Soares é morto por PM em frente a mercado na Zona Sul de SP
Reprodução/Arquivo pessoal
‘Um menino doce que amava a família’
A mãe do jovem, Silvia Aparecida da Silva, disse ao g1 que o filho era usuário de drogas e lutava contra o vício há alguns anos.
“Gabriel era um menino doce, meigo e sonhador. Me falava que ia dar uma casa. Ele só tinha 26 anos. Uma vida inteira pela frente […] Eu estou destruída por dentro. Tenho problema no coração, uso marca-passo. Estou sofrendo muito, é uma dor não tem como explicar. Só sei que dói ter perdido meu filho”, desabafou Silvia.
O jovem morava com a mãe e os dois irmãos próximo ao mercado. Ela percebeu que Gabriel não havia voltado para casa por volta das 5h de 4 de novembro.
O irmão de Gabriel contou à mãe que passou pelo mercado por volta da meia-noite e viu uma pessoa morta no chão coberta por uma lona: “A bota era igual à do meu irmão”.
Silvia chegou a ir trabalhar, porém, como Gabriel não apareceu, decidiu procurá-lo pelo bairro com o ex-marido. Ao chegar ao mercado, um funcionário informou aos pais que “mataram um noia”. Foi neste momento que Silvia e Antônio descobriram a morte do filho.
“Foi muito covarde. Podia ter levado preso. Existe cadeia para isso. É o procedimento. Porque você ter uma arma Glock .40, um tiro só já faz um estrago”, disse Silvia indignada.
Para a família, a versão apresentada pelo policial militar e pelo atendente do mercado é contraditória. Eles afirmam que Gabriel não fugiu após ser baleado e ainda se voltou contra o agente. “Se você tomar um tiro, qual é a sua reação? Sair correndo, não voltar para o local em que o cara está atirando”, afirma o pai.