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Luiz Fogaça Balboni, o Zizo, foi morto pelo Estado em 25 de setembro de 1969, quando tinha 24 anos. Criação do parque, localizado entre Tapiraí (SP) e São Miguel Arcanjo (SP), foi uma forma de a família ressignificar a ausência do jovem. Luiz Fogaça Balboni, o Zizo, foi morto pelo Estado em 25 de setembro de 1969, quando tinha 24 anos
Arte/g1
Cerca de 300 hectares de mata preservada e centenas de animais silvestres ressignificam a ausência de Luiz Fogaça Balboni, o Zizo, morto aos 24 anos pela ditadura militar. O parque, localizado entre Tapiraí (SP) e São Miguel Arcanjo (SP), se tornou um símbolo de resistência e, em 2025, completa 27 anos.
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Inaugurado em 1998, o Parque Ecológico Zizo nasceu após a família de Luiz receber uma indenização do governo, ao reconhecer a morte do estudante, quase 30 anos após o crime. O dinheiro foi utilizado para comprar a área de 2.685.854 m², preservando a memória da vítima.
“A gente não estava preparado para lidar com esse assunto [sobre o valor recebido], porque a gente buscava saber o que tinha acontecido com o Zizo. A minha mãe era viva e sofreu muito com a morte dele”, relembra Vital Fogaça Balboni, irmão mais novo de Zizo.
Na época, a família pensou em utilizar o dinheiro para abrir uma maternidade em São Miguel Arcanjo. “De repente, um dos irmãos deu a ideia de comprar as terras e a gente decidiu que era uma homenagem ao Zizo e criamos o que hoje é conhecido como o Parque do Zizo”, conta.
“Nada repara a morte de um ente querido, mas nós acertamos, lá atrás, fazer o que nós fizemos. O parque virou um centro muito lindo, maravilhoso, de formação de pessoas, de cuidar da gente do entorno. Trouxe para nós muita alegria e continua trazendo.”
Parque do Zizo foi criado como homenagem a Luiz Fogaça Balboni, vítima da ditadura militar em 1969
Imagem cedida/Apaz
Morto em emboscada
Luiz Fogaça Balboni foi morto em 25 de setembro de 1969, em uma emboscada em São Paulo (SP). Zizo era o irmão mais velho da família e tinha sete irmãos. O jovem cursava o terceiro ano de engenharia quando, em 1968, trancou a matrícula e começou a atuar no movimento estudantil contra a ditadura.
Ao g1, Vital conta que participou dos protestos contra a ditadura ao lado do irmão, após os dois se aliarem ao grupo Ala Vermelha. “Quem participava dos movimentos contra a continuação do poder militar no governo começou a ver sangue correndo nas ruas, execuções sumárias, amigos e parentes mortos. A alternativa foi revidar”, relembra.
“Nós atuávamos na Ala Vermelha, ele no movimento estudantil e eu no bancário. Diante desse quadro, o Zizo decidiu partir para a luta armada. Ele entrou na Ação Libertadora Nacional (ALN) na clandestinidade. Morreu em uma emboscada cinco meses depois.”
Zizo aparece na foto – sentado e de camiseta rosa – ao lado da família
Arquivo pessoal
Segundo o irmão, Zizo foi atingido por um tiro nas costas, quando ele e o líder do grupo, Manoel Cyrillo, foram até um Fusca que haviam estacionado na Alameda Campinas. No local, policiais aguardavam as vítimas.
“A gente sabia que o Zizo havia dado entrada no Hospital das Clínicas praticamente morto, entrou morto. Descobrimos que a última pessoa que esteve com o Zizo era o Manoel Cyrillo, e ele contou que a emboscada foi por volta das três horas da tarde, e os policiais mandaram o Zizo às seis horas da tarde”, relata Vital.
“A comissão julgou procedente a responsabilidade do Estado na morte do Zizo, pois, apesar do evento estar a apenas 10 minutos do Hospital das Clínicas, eles ficaram mais de três horas torturando o Zizo”, lembra.
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Em 1971, o delegado Sérgio Fleury deu uma entrevista para a revista Realidade, da editora Abril, e assumiu a morte de Zizo após responder à pergunta: “Em função da sua atividade sempre tão cheia de riscos, quantas pessoas o senhor já viu morrer na sua frente?”.
O delegado Fleury, do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo durante a ditadura militar, respondeu: “Várias, o ‘Brechó’, Luiz Fogaça Balboni, Toledo, Marighella e outras, vítimas de ocorrências policiais”.
Delegado Fleury assumiu que presenciou a morte de Zizo em uma entrevista de 1971
Arquivo pessoal
“A morte do Zizo pegou meus pais desprevenidos. O caixão dele veio lacrado, só aparecia o rosto e apresentava uma marca profunda na boca. Meus pais não tinham a menor ideia do que fazíamos em São Paulo. Minha mãe chorou dez anos seguidos, todos os dias”, relembra Vital.
Na certidão de óbito de Zizo, a causa da morte ainda consta como “lesão traumática do pulmão”. Vital afirma que já solicitou a correção do registro a partir da resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), aprovada no dia 13 de dezembro de 2024.
Símbolo de resistência e preservação
Atualmente, o Parque Ecológico do Zizo está sendo administrado pela segunda geração da família. Raphael Arcänjo, presidente da Associação Parque do Zizo (Apaz) é filho de Vital e sobrinho de Zizo. Ele fala sobre a importância de fazer parte do movimento.
“Eu sou o continuador, aquele que mexe com toda essa história. O Zizo é um exemplo de resistência e luta contra a opressão, a violência, a intolerância e a mediocridade. Ele se tornou uma floresta e a sua trincheira continua viva na terra em forma de amor e paz na floresta.”
Parque do Zizo abriga diversas espécies de animais e flora, em São Miguel Arcanjo
Imagem cedida/Apaz
Segundo o presidente da associação, o parque é um protesto delicado, altruísta e que defende o direito à vida e à liberdade: “São quase três décadas de resistência, conservando e preservando o bioma mais biodiverso do planeta Terra”.
No parque ecológico, há milhares de árvores, incluindo espécimes seculares e milenares, além de espécies de animais que correm risco de extinção, como a onça-pintada e a jacutinga.
“Sem contar a importantíssima reserva mineral de galerias hidrográficas que geram. É impossível contabilizar ou elencar a extrema importância desta floresta primária, não apenas para a região, mas para toda a biosfera”, afirma Raphael.
Toda a área foi mapeada por uma empresa de georreferenciamento, em 2010, surpreendendo a família de Zizo. “Nos deparamos com um ‘Z’ do Zizo, encrustado na floresta, desenhado não por mãos humanas e, sim, pela tecnologia”, conta Vital.
Área total do Parque Ecológico Zizo, com 2.685.854 m², foi mapeada e curiosamente forma a letra ‘Z’
Arquivo pessoal
Desde a pandemia, o parque está em reforma e, em janeiro de 2025, foi reaberto para visitantes interessados em conhecer as trilhas, com possibilidade para camping. Raphael Arcänjo comenta sobre a importância de apoio financeiro para manter o local.
“Recentemente, fizemos captação de recursos por meio de financiamento coletivo, mas infelizmente não atingimos a meta. Captamos aproximadamente 10% do valor estimado. É imprescindível a ajuda da sociedade civil, de instituições e órgãos públicos para apoiar este projeto, tão necessário nos tempos atuais.”
Para Raphael, a repercussão do filme “Ainda Estou Aqui”, indicado a três categorias do Oscar 2025, traz à tona as histórias das diferentes vítimas da ditadura, como Rubens Paiva e Zizo: “Esse filme mostra a realidade vivida durante os anos sombrios da ditadura militar brasileira”, explica.
“É importante lembrar para não esquecer a violência e brutalidade que assolou o país por mais de 20 anos. Esperamos, sim, que a repercussão do filme possa ampliar a consciência política e, consequentemente, o interesse pela história do Zizo e sua importância para as gerações futuras”, finaliza.
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