
Operação do MP e PF contra lavagem de dinheiro do PCC por meio de fintechs prendeu policial civil nesta terça. Policial Civil de SP é preso em operação contra fintechs ligadas ao PCC
Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), obtidos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público de São Paulo, indicam que a fintech 2 GO Bank, de propriedade do policial civil Cyllas Elia Júnior, se envolveu em transações suspeitas com criptomoedas relacionadas a organizações terroristas.
Os relatórios não dão os nomes das organizações terroristas.
Cyllas Elia foi preso em São Paulo nesta terça-feira (25) na Operação Hydra. A ação mirou operações ilegais de duas fintechs – empresas que recebiam depósitos milionários, oriundos do narcotráfico, em nomes de laranjas, por meio de boletos, cartões de crédito e depósitos. Depois, os valores eram transferidos para outras contas ligadas a narcotraficantes do PCC.
As informações foram reveladas em delação premiada firmada entre o MP e o empresário Antônio Vinícius Gritzbach, delator do PCC executado no Aeroporto Internacional de São Paulo em novembro do ano passado. Anter de ser assassinado, ele apresentou à promotoria contratos assinados pelo traficante em operações imobiliárias feitas através do banco.
O Ministério Público de São Paulo informou que apesar de citar as informações em relatório da investigação, os promotores ainda analisam as relações da empresa do policial civil com terroristas.
Alerta em Israel
O alerta sobre possíveis relações da fintech de Cyllas Elia com terroristas foi feito pelo Banco Topázio (B2B) ao Ministério da Defesa de Israel, que emitiu um comunicado sobre a existência de carteiras digitais mantidas em uma exchange (corretora) que seriam operacionalizadas para movimentação de criptomoedas “com fins de perpetração do crime de terrorismo, conforme os critérios da lei israelense.”
De acordo com a PF e o MP, a partir dessa informação, o Banco Topázio monitorou transações em criptoativos, identificando transações entre carteiras digitais de exchanges que são clientes do Banco Topázio e as carteiras digitais elencadas no comunicado.
Após o cruzamento de dados, o banco concluiu que “há relação entre os ativos virtuais adquiridos pelos clientes do Banco Topázio no exterior com recursos enviados por meio de operações de câmbio com as wallets listadas no comunicado emitido pelo Ministério da Defesa Israelense.”
Entre os clientes mencionados estão o 2 GO Bank e a Paim Distribuidora Ltda. Os Relatórios de Inteligência Financeira apontaram relacionamento próximo entre as duas empresas e que, durante o ano de R$ 9 milhões para a 2GO.
A Paim Distribuidora Ltda foi constituída em 19/08/2022, com área de atuação cadastrada como “edição integrada à impressão de livros” com capital social de R$ 400 mil, em São Paulo. O sócio é militar aposentado.
Como foi a operação
Investigadores do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público e da Polícia Federal prenderam na manhã desta terça-feira (25) um policial civil em uma operação de combate à lavagem de dinheiro do PCC por meio de duas fintechs (instituições financeiras digitais).
A ação é mais um desdobramento da delação de Vinicius Gritzbach, acusado de lavar dinheiro para a facção criminosa e assassinado com tiros de fuzil no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, no final do ano passado.
Preso nesta terça, o policial Cyllas Elia Junior se apresenta como CEO da 2GO Bank, uma das instituições financeiras citadas pelo delator do PCC. A outra empresa é a InvBank.
Segundo a investigação, elas movimentaram recursos milionários da facção dissimulando sua origem ilícita por meio da compra de imóveis.
Segundo o promotor Lincoln Gakiya, o crime organizado atingiu “outro patamar” e hoje opera no mercado financeiro formal.
Policial preso
Elia Junior estava afastado desde 2022 de suas funções a pedido e, no começo deste ano, voltou a trabalhar na Polícia Civil. Ele estava lotado no Decap, o departamento responsável pelas delegacias da capital.
Cyllas Elia Junior
Reprodução/Redes sociais
Ele já tinha sido preso no ano passado em outra operação da PF em Campinas pela ligação na lavagem de dinheiro para criminosos chineses. Ele foi solto no fim de 2024.
Procurada, a defesa de Cyllas Elia disse que desconhece a prisão dele e não quis se manifestar neste momento.
A Lei Orgânica da Polícia Civil não veda a participação de policiais civis em sociedades comerciais.
Além do mandado de prisão contra o policial civil, também foram cumpridas ordens de busca e apreensão nas sedes das duas empresas, além de endereços de seis pessoas ligadas à gestão e funcionamento dessas fintechs.
A Justiça também determinou o bloqueio de até R$ 27 milhões dos investigados e das fintechs e decretou a suspensão das atividades dos dois bancos digitais.
Material apreendido na operação do Gaeco e da PF contra fintechs 2GO Bank e InvBank
Reprodução
Procurada, a Secretaria da Segurança Pública informou que a Corregedoria da Polícia Civil acompanha os desdobramentos da operação e está à disposição da PF e do Gaeco para colaborar com as investigações.
“É importante ressaltar que as forças de segurança do Estado são instituições legalistas que operam estritamente dentro de seu dever constitucional, seguindo protocolos operacionais rigorosos, com transparência e respeito aos direitos humanos fundamentais”, diz trecho da nota.
30 milhões movimentados
As fintechs oferecem inovações no mercado financeiro por meio do uso intenso de tecnologia, como o envio de pagamentos para o exterior. No Brasil, há várias categorias de fintechs: de crédito, de pagamento, gestão financeira, empréstimo, investimento, financiamento e câmbio, entre outras.
No entanto, na avaliação de investigadores, a regulamentação atual tem brechas que faz com que as operações dessas empresas não entrem no radar do Banco Central.
As duas fintechs alvo da operação desta terça trabalhavam com cifras bilionárias, segundo operações da própria PF conduzidas no ano passado. Os valores movimentados chegam próximo a R$ 30 milhões.
Em 2022, o 2GO Bank promoveu um evento em São Paulo sobre segurança bancária na internet. Várias autoridades participaram, inclusive como palestrantes, como o delegado-geral da Polícia Civil de SP, Artur Dian, e o promotor de Justiça Richard Encinas, do Cyber Gaeco, além do ex-chefe da Divisão de Crimes Cibernéticos do Deic Carlos Afonso.
Apurações de promotores e analistas do Gaeco em conjunto com policiais federais descobriram “um complexo esquema ilícito, engendrado por intermédio do emprego indevido de empresas de tecnologia financeira”.
As duas empresas são suspeitas de receber valores em espécie e depois movimentá-los e alocá-los, dando falsa aparência de licitude para beneficiar o PCC.
Os investigadores afirmam que essas fintechs direcionavam os depósitos que recebiam para contas de “laranjas”, mantendo pleno controle de tais contas.
Vinicius Gritzbach foi executado no aeroporto de Guarulhos em novembro
Montagem/g1/Reprodução/Redes Sociais