Estado de Sítio, de Defesa, GLO: entenda o que diz a Constituição sobre termos que apareciam em reuniões sobre golpe


Segundo depoimentos de militares, Bolsonaro e aliados teriam levantado hipótese de um golpe de Estado após as eleições de 2022. Previstos na Constituição, mecanismos não respaldam ruptura do regime democrático. General Freire Gomes em cerimônia ao lado de Bolsonaro e do ex-ministro da Defesa Paulo Sergio Nogueira
Eraldo Peres/AP
Os ex-comandantes do Exército general Freire Gomes e da Aeronáutica brigadeiro Baptista Junior relataram à Polícia Federal que, em reuniões com Jair Bolsonaro (PL) e aliados, foram discutidas hipóteses de manutenção do ex-presidente no poder após a derrota nas eleições de 2022.
Segundo depoimento de Baptista Junior à PF, em um encontro no Palácio da Alvorada, Bolsonaro teria sugerido atentar contra o regime democrático por meio de instrumentos previstos na Constituição, como decretos de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), de Estado de Defesa ou de Estado de Sítio.
Já Freire Gomes disse que, em uma reunião no Alvorada, um ex-assessor de Bolsonaro teria lido o conteúdo de uma minuta golpista. E que o ex-presidente teria dito que o documento estava em “estudo”.
A minuta previa instaurar um Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e “apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral” de 2022, no qual Bolsonaro foi derrotado por Lula.
Enquanto isso, em manifestações nas ruas, apoiadores de Bolsonaro invocavam o artigo 142 da Constituição Federal.
Previstos na Constituição, esses mecanismos não respaldam uma tentativa de ruptura democrática com a manutenção de um presidente no poder.
Entenda nesta reportagem (clique no link para seguir ao conteúdo):
O que é Estado de Defesa?
O que é Estado de Sítio?
O que é GLO?
O que diz o artigo 142 da Constituição?
Freire Gomes diz à PF que Bolsonaro participou de negociações que poderiam levar a um golpe de estado
O que é Estado de Defesa?
O Estado de Defesa é decretado para preservar ou restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social, quando estas forem:
ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional
atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza
O decreto de Estado de Defesa determinará o seu tempo de duração, especificará as áreas abrangidas e indicará medidas que poderão ser adotadas, como restrições aos direitos de:
reunião
sigilo de correspondência
sigilo de comunicação
Também é prevista a ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública.
Para decretar o Estado de Defesa, o presidente deve ouvir os Conselhos da República e de Defesa Nacional.
O Estado de Defesa não necessita de autorização do Congresso Nacional, mas precisa ser confirmado pelo Legislativo.
Uma vez decretado o Estado de Defesa, o presidente da República, dentro de 24 horas, precisa submeter o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá, por maioria absoluta, se o ratifica.
Caso o Congresso rejeite o decreto, o Estado de Defesa deve ser interrompido.
Desânimo de Bolsonaro após perder eleições foi porque ele não conseguiu aplicar golpe
O que é Estado de Sítio?
O Estado de Sítio pode ser decretado em caso de comoção grave de repercussão nacional; de ineficácia comprovada de medida tomada durante Estado de Defesa; ou de declaração de estado de guerra ou resposta a uma agressão armada estrangeira.
Para decretá-lo, o presidente precisa solicitar autorização ao Congresso Nacional. Para aprovação do Estado de Sítio, é necessário o apoio da maioria absoluta do Legislativo.
O prazo do Estado de Sítio, no caso de comoção grave ou de ineficácia de medida tomada em Estado de Defesa, é de 30 dias, podendo ser prorrogado outras vezes pelo mesmo período.
No caso de guerra, ou de agressão estrangeira, poderá durar até o fim da guerra ou da agressão.
Durante o Estado de Sítio decretado em virtude de comoção grave de repercussão nacional ou de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa, só poderão ser tomadas contra pessoas estas medidas:
obrigação de permanência em localidade determinada
detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns
restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei
suspensão da liberdade de reunião
busca e apreensão em domicílio
intervenção nas empresas de serviços públicos
requisição de bens
O que é GLO?
Um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) é prerrogativa do presidente da República e está previsto na Constituição. Geralmente é aplicado quando a segurança pública de um estado – responsabilidade dos governos estaduais – passa por uma crise e o governador pede ajuda federal.
Trata-se de uma medida que permite às Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) atuarem com poder de polícia até o restabelecimento da normalidade na segurança.
Recentemente, foi editado um decreto de GLO para que militares atuem na fiscalização de portos e aeroportos.
Anteriormente, a medida já foi utilizada para conter crises de segurança no Rio de Janeiro, no Espirito Santo e no Rio Grande do Norte.
Equivocadamente, manifestantes pedem intervenção militar com base no artigo 142 da Constituição
Marina Pinhoni/G1
O que diz o artigo 142 da Constituição?
O artigo 142 da Constituição regulamenta a competência das Forças Armadas, mas não autoriza uma “intervenção militar constitucional”, segundo parecer da Câmara dos Deputados sobre o artigo.
Textualmente, o dispositivo da Constituição diz o seguinte:
“Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Segundo a Câmara dos Deputados, a Constituição de 1988 separa, explicitamente, o poder civil e político da atuação militar. As Forças Armadas se organizam de forma independente em relação ao governo e são um órgão de Estado, “indiferentes às disputas políticas que se desenvolvem no meio civil”.
“A ‘autoridade suprema’ do Presidente da República em relação às forças armadas significa simplesmente que a direção do Chefe do Poder Executivo não pode ser contrastada por qualquer autoridade militar, o que mais uma vez revela a prevalência do Poder Civil”, diz o parecer da Câmara.
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