
Uso humano coloca sob risco de extinção 5.775 espécies de vertebrados, segundo artigo. Avanço da tecnologia impulsionou cenário predatório. Barco de pesca descarrega no mercado de peixe de Onahama, no Japão
Soichiro Koriyama / Bloomberg via Getty Images
Com o avanço da tecnologia, não é segredo que as técnicas de caça e pesca estão cada vez mais eficientes. Com 7,9 bilhões de seres humanos espalhadas por todos os continentes, mal podemos imaginar o impacto causado pelo homem como predador de outras espécies.
Segundo estudo publicado na revista Communications Biology por um grupo internacional de pesquisadores, do qual participou o biólogo brasileiro Mauro Galetti, a espécie humana produz um impacto direto sobre 14.663 espécies de vertebrados.
Para nível de comparação, foi mensurado o impacto de predação da coruja bufo-real (Bubo bubo), a maior ave de rapina noturna do mundo e um dos grandes predadores do planeta. De altura, ela mede quase 80 centímetros e pode chegar a 2 metros de envergadura.
Na área de distribuição em que ocorre – Europa, grande parte da Ásia e Norte de África – a coruja se alimenta de 552 espécies de vertebrados, ou seja, a diversidade de presas consumidas pelo animal ainda fica muito longe do impacto da predação pelo homem.
O estudo avaliou o podes predatório de 20 grandes caçadores da natureza, dentre eles leão, tubarão-branco, tigre, entre outras espécies.
Diversidade de presas (número de espécies; escala logarítmica) de humanos e predadores comparáveis em áreas geográficas equivalentes, com porcentagens indicando sobreposição de presas humanas com cada predador
Alexandre Affonso / Revista Pesquisa FAPESP
No passado, o ser humano consumia os animais para comer, isso causou a extinção de mamutes, preguiças gigantes, de outros animais, mas sempre foi para comer ou para sobreviver. Hoje esse padrão mudou, não é simplesmente para comer, mas também a predação para pet ou para fins medicinais, a gente ampliou muito. Com o avanço da tecnologia, ele consegue predar praticamente qualquer animal do planeta
Dos 14.663 vertebrados explorados pelo ser humano, cerca de 55% (8.037) são utilizados como alimento. Das espécies de peixes marinhos, 72% foram identificadas como fonte de alimento humano, em contraste com os animais terrestres, dos quais apenas 39% foram utilizados para esse fim.
A ONG Rhino Revolution têm soltado os animais na natureza sem os chifres, para protegê-los da caça
Rhino Revolution/Divulgação
Contudo, o consumo alimentar não é o único propósito dessa exploração. Uma parcela significativa dos vertebrados é explorada para a produção de roupas, medicamentos ou ainda como alimento para outras espécies, além de serem criados como animais de estimação, entre outras “utilidades”.
De acordo com os autores do estudo, os peixes e mamíferos são principalmente consumidos como alimento, enquanto as aves, répteis e anfíbios são frequentemente destinados ao mercado de animais de estimação.
Papagaio-cinzento criado como animal de estimação
Julie R. / Wikimedia Commons
Nas áreas equatoriais, como o Sudeste Asiático, onde há muita biodiversidade, há uma maior incidência de caça e pesca em comparação com outras regiões do mundo. Os níveis de exploração foram particularmente elevados nas bacias oceânicas da Índia, norte da África e Eurásia, em contraste com o oceano Austral, leste e sul da América do Norte, América do Sul e América Central.
Segundo os resultados, enquanto a predação para alimentação é predominante nos países asiáticos, o tráfico de animais é a principal causa de exploração nos países amazônicos.
“Hoje, o grande problema da humanidade é consumo, as pessoas precisam de muitas coisas para viver, desde consumo de carne. Nós vamos consumir produtos sustentáveis? Você precisa ser um consumidor que está sempre pensando de onde vem o que você está comendo, usando, consumindo de forma geral. Certamente é o consumidor que precisa estar escolhendo as melhores alternativas”, aponta o pesquisador.
O trabalho aponta que o uso humano coloca sob risco de extinção 5.775 espécies de vertebrados, sendo o grupo dos mamíferos o mais ameaçado.
“A gente sabe que quanto maior o animal, maior o risco de extinção deles pelo humano. Todos os maiores vertebrados terrestres que não são domesticados estão ameaçados de extinção, com algumas exceções”, reforça Galetti.
Os pesquisadores afirmam que estudos sobre o uso do ser humano por diferentes espécies são cruciais para a elaboração de políticas publicas que auxiliem na conservação e manejo sustentável de animais silvestres.
De acordo com eles, ter como base a maneira como os povos originários lidaram ao longo dos milênios com alguns tipos de animais pode ajudar a estabelecer formas de exploração não nocivas.
“Cação” é o nome geralmente dado à carne de pequenos tubarões
Sea Sheperd Brasil
“Temos que reduzir o consumo de carne bovina, aprender a manejar os animais silvestres de forma sustentável e repopular as ‘florestas vazias’, senão vamos acabar causando uma extinção em massa”, finaliza.
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