De onde vêm os asteroides?


Alguns asteroides podem nos ajudar a compreender o passado da Terra – outros podem ameaçar nossa própria sobrevivência Alguns asteroides podem nos ajudar a compreender o passado da Terra – outros podem ameaçar nossa própria sobrevivência
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Todos os anos, um pedaço de rocha do tamanho de um carro se lança violentamente no espaço em curso de colisão com o nosso planeta, segundo a Nasa.
Felizmente, a atmosfera da Terra age como um escudo protetor. Por isso, em vez de se chocar com o solo do planeta, o asteroide se queima e produz um impressionante show de luzes, riscando o céu como um meteoro ou uma bola de fogo.
Mas, infelizmente, outros asteroides muito maiores não estão ali para nos entreter. Seu potencial é muito mais ameaçador.
“Existem asteroides de todos os tamanhos”, afirma o cientista planetário Michael Küppers, da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês).
“Os realmente grandes, como o asteroide de cerca de 10 km [de largura] que acreditamos ter causado a extinção dos dinossauros, podem surgir uma vez a cada 100 milhões de anos.”
O asteroide 2024 YR4, descoberto em dezembro do ano passado, vem recentemente ocupando as manchetes de todo o mundo. Com cerca de 40 a 90 metros de largura, ele é maior do que um edifício de 12 andares.
Probabilidade de impacto, locais da possível queda, risco para o Brasil: tudo sobre o asteroide 2024 YR4
Em janeiro deste ano, a ESA calculou a trajetória da rocha e previu inicialmente que havia 1,2% de possibilidade de impacto com a Terra, no dia 22 de dezembro de 2032.
Este índice ultrapassou o confortável limite de 1% de risco para um objeto próximo da Terra e acionou a necessidade de investigação por diversas organizações de defesa planetária, além do Congresso e do presidente dos Estados Unidos.
Felizmente, o tamanho do YR4 não é suficiente para conseguir extinguir a nossa espécie. Mas ainda poderia ser considerado um “assassino de cidades”, segundo alguns especialistas – se estiver no limite superior da faixa de tamanho estimada e aterrissar em uma área densamente povoada.
Em fevereiro de 2025, o risco de que o asteroide venha a atingir a Terra subiu rapidamente para 3,1%, ou 1 em 32. Por sorte, a humanidade conseguiu evitar o pânico em massa e o risco desde então foi reduzido para 0,001%, o que é bastante tranquilizador.
Mas de onde veio este asteroide, para começar? E o quanto devemos nos preocupar com a possibilidade de surgir um cenário parecido no futuro?
A análise dos dados da missão Dart, da Nasa, levou os cientistas a concluírem que a órbita do asteroide foi alterada com sucesso.
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Cinturão distante
Quando o assunto é compreender os asteroides, astrônomos e cientistas ainda analisam as cartas que têm nas mãos para decifrar as regras deste potencialmente arriscado jogo celestial.
“Cientificamente, podemos aprender muito com os asteroides”, segundo o astrônomo Alan Fitzsimmons, da Universidade Queens em Belfast, no Reino Unido.
Ele participa de uma das pesquisas celestes da Nasa que busca e rastreia objetos próximos da Terra (NEOs, na sigla em inglês) – asteroides cuja órbita os traz para até 195 milhões de quilômetros do Sol.
“Os asteroides que detectamos são geralmente fragmentos de corpos muito maiores que se formaram no nascimento do nosso Sistema Solar”, explica Fitzsimmons.
“Por isso, estudando sua composição química, conseguimos alguma ideia das condições no início do sistema, pois, desde então, ele evoluiu dinamicamente nos últimos 4,6 bilhões de anos.”
Estes restos rochosos antigos, às vezes, são denominados planetas menores. Frequentemente irregulares e repletos de crateras, eles também podem ser esféricos. Eles podem girar lenta ou rapidamente, ou ainda rolar pelo espaço.
Os asteroides, normalmente, são solitários. Mas, às vezes, eles podem ser encontrados em pares – são os asteroides duplos ou binários. Alguns chegam a ter sua própria lua.
O website do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa mantém registros dos seus números. Na última contagem, havia mais de 1,4 milhão de asteroides no nosso Sistema Solar.
A maioria está localizada no cinturão de asteroides, entre Marte e Júpiter, mas milhões de outros são pequenos demais para serem detectados.
Na maior parte do tempo, estes asteroides permanecem restritos naquele cinturão interplanetário, graças ao campo gravitacional de Júpiter. Eles não conseguem se reunir para formar um corpo maior.
Mas, ocasionalmente, outro asteroide ou a influência da gravidade jupiteriana pode impulsionar alguns deles para outra órbita em torno do Sol, em direção ao Sistema Solar interno.
Pistas celestiais
Quando um asteroide é ejetado do seu trajeto habitual e se dirige potencialmente na direção da Terra, nosso primeiro desafio é detectá-lo.
“A aparência de um asteroide ao telescópio é simplesmente de um ponto de luz contra outros pontos de luz, que são as estrelas, exceto por estar se movendo”, explica a oficial de defesa planetária da Nasa Kelly Fast.
“E está refletindo a luz do Sol.”
Quanto mais brilhante for o asteroide, maior ele será. Mas sua cor também afeta o brilho.
Um pequeno asteroide branco pode refletir mais luz do que um muito maior, mas escuro. Mas esta não é uma ciência exata, o que explica por que o tamanho do YR4 é estimado em 40 a 90 metros de largura.
Quanto mais informações tivermos, mais precisa será esta estimativa.
O meteoro de Chelyabinsk tinha apenas 20 metros de diâmetro
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“Uma equipe da Nasa e outra da ESA irão utilizar o telescópio espacial James Webb para realizar observações do YR4 com infravermelho”, segundo Fast. Estas medições das emissões térmicas do asteroide “podem ser úteis para restringir esta faixa de tamanho.”
Da mesma forma que a maioria dos asteroides, o YR4 vem do cinturão entre Marte e Júpiter.
“É difícil dizer de qual parte do cinturão”, explica Fitzsimmons. “Uma indicação que temos é o espectro da sua superfície.”
Examinando a intensidade da luz emitida ao longo de uma série de comprimentos de onda, podem ser identificados materiais específicos sobre a superfície do asteroide.
“O YR4 é um asteroide rochoso com deficiência de elementos mais leves, como carbono”, segundo Fitzsimmons. “Isso nos diz que ele provavelmente veio do cinturão de asteroides interno.”
“Mas não sabemos exatamente de onde – e talvez nunca venhamos a saber.”
Os asteroides também não são iguais. “Existem populações diferentes”, segundo Fast.
“Alguns são rochosos, outros são carbonáceos e alguns contêm teor metálico, dependendo dos corpos originais de onde vieram.”
Embora existam tipos raros de asteroides, mais de 75% deles são carbonáceos, ou do tipo C. Eles contêm carbono e sua coloração é preta como carvão.
Os demais são principalmente do tipo S, ou silicáceos – uma mistura de metais e cristais de silicato – ou asteroides metálicos ou do tipo M, que contêm predominantemente ferro e níquel.
Um asteroide que desperta particularmente o interesse dos cientistas é uma grande rocha rica em metais em forma de batata, que habita o principal cinturão de asteroides do Sistema Solar. Acredita-se que aquele asteroide possa conter até 95% de níquel e ferro, o que é similar ao núcleo da Terra.
Seu estudo irá, portanto, aumentar nossa compreensão sobre a formação do nosso planeta. A missão Psyche, da Nasa, está atualmente a caminho do asteroide e está prevista para chegar em agosto de 2029.
Em termos de teor metálico, asteroides como o Psyche 16 também podem ser extremamente valiosos. Calcula-se que ele contenha recursos no valor de cerca de US$ 10 quatrilhões (cerca de R$ 56,7 quatrilhões).
Futuramente, caso a mineração de asteroides venha a ser necessária, além de econômica e tecnicamente viável, acredita-se que eles possam fornecer enorme quantidade de recursos.
Em defesa da Terra
Conhecer a composição de um asteroide também é fundamental por razões de defesa.
Um asteroide rico em ferro, por exemplo, causaria mais danos em um eventual impacto do que os carbonáceos. Isso porque ele é mais denso, tem mais massa e teria mais energia, se atingisse uma lua ou um planeta.
É possível observar que a Lua da Terra é repleta de crateras formadas pelo impacto de asteroides, já que sua fina atmosfera, ou exosfera, não consegue protegê-la.
Embora seja improvável que a Terra receba o impacto do YR4, ainda há 1,7% de possibilidade que ele atinja a nossa Lua.
O nível de destruição também depende da estrutura do asteroide. “Se soubermos mais sobre a estrutura desses objetos, podemos calcular com maior precisão o que acontece quando ele atingir a atmosfera da Terra”, explica Fitzsimmons.
“Quase todos os asteroides com menos de 10 km de comprimento são objetos sólidos fortemente fraturados ou pilhas de rochas – fragmentos menores de asteroides agrupados, principalmente, pela gravidade.”
Eros foi o primeiro asteroide próximo da Terra a ser descoberto. O responsável pelo feito foi o astrônomo alemão Carl Gustav Witt (1866-1946), em 1898
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Mas esse asteroide composto de uma pilha de escombros seria mais propenso a se queimar na atmosfera e, com isso, ser menos perigoso?
“Infelizmente, não”, afirma Fitzsimmons. “Se um asteroide atingir a Terra a 17 km por segundo, ele fica na atmosfera por menos de 10 segundos antes do impacto.”
A atmosfera da Terra age como barreira protetora, mas, ainda assim, não evita todos os desastres.
“Um objeto do tamanho do YR4, provavelmente, só chegaria até alguns quilômetros acima da superfície da Terra. Ele perderia sua energia e explodiria em grande altitude”, explica Fitzsimmons.
“Nós não teríamos uma cratera, mas sim um jato de ar que poderia ser simplesmente tão devastador quanto se ele atingisse o solo.”
No momento, não sabemos se o YR4 é um objeto sólido ou uma pilha de rochas, mas um jato de ar poderia ser um evento significativo, considerando o que aconteceu em 2013.
Naquele ano, uma bola de fogo – como é chamado o asteroide depois que ele entra na atmosfera da Terra – explodiu a cerca de 22,5 km de altitude sobre a cidade de Chelyabinsk, na Rússia. Testemunhas descreveram a luz como mais brilhante que o Sol e a onda de choque da explosão danificou mais de 4 mil edificações e feriu 1,2 mil pessoas.
“O tamanho do asteroide era de cerca de 20 metros”, segundo Küppers. “Este talvez seja o limite aproximado para começarmos a nos preocupar se ele atingisse áreas povoadas.”
Coincidentemente, no dia do evento de Chelyabinsk, um comitê das Nações Unidas estava reunido em Viena, na Áustria, para discutir a defesa contra impactos futuros de asteroides.
A reunião resultou na criação da Rede Internacional de Alertas de Asteroides, presidida pela Nasa, e de um Grupo Consultor de Planejamento de Missões Espaciais, aberto à colaboração de agências espaciais de todo o planeta.
Felizmente, diversas missões já estudaram os asteroides. Tudo começou com a Galileo, que voou perto de dois deles, no início dos anos 1990.
No ano 2000, a nave Near Shoemaker, da Nasa, foi a primeira a orbitar um asteroide, chamado Eros. Um ano depois, ela também seria a primeira a pousar em um deles.
A missão japonesa Hayabusa 2 visitou o asteroide tipo C 162173 Ryugu em 2018 e 2019. Ela chegou a enviar uma amostra para a Terra, em um recipiente hermeticamente fechado, em 2020.
A missão americana OSIRIS-REx (Origens, Interpretação Espectral, Identificação de Recursos e Segurança – Explorador de Regolitos, na sigla em inglês) coletou poeira e rochas do asteroide Bennu e as enviou para a Terra em 2023.
No início deste ano, foi publicada a primeira análise em profundidade das moléculas e minerais contidos nas amostras. Foram encontrados 14 dos 20 aminoácidos usados pelos seres vivos para produzir proteínas na Terra.
Agora com o nome OSIRIS-APEX, a espaçonave está a caminho de explorar o asteroide Apophis.
Todas estas missões e outras mais permitiram aos cientistas estudar a composição e a granulometria de diversos asteroides, além das propriedades magnéticas das amostras, para servir de base para a nossa compreensão do campo magnético primordial do Sistema Solar.
Mas existe outra razão para estudar os asteroides, despertada pelas preocupações com o YR4: a proteção do nosso planeta.
Cientistas encontraram os ingredientes da vida nas amostras trazida do asteroide Bennu pela cápsula da espaçonave OSIRIS-REx
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Em 2022, a missão da Nasa Dart (Teste de Redirecionamento de Asteroide Duplo, na sigla em inglês) dirigiu-se deliberadamente rumo a um sistema de asteroides binários inofensivo (pelo menos para nós, aqui na Terra).
O sistema consiste do asteroide Didymos (780 m) e do seu satélite ou asteroide menor em sua órbita, Dimorphos (160 m). A espaçonave utilizou a si própria como pêndulo cinético e se dirigiu a Dimorphos a cerca de 22.530 km por hora.
Este foi o primeiro teste da Nasa para saber se seria possível desviar um asteroide do seu trajeto – e foi um sucesso. A órbita de Dimorphos foi alterada após o impacto.
Será que isso significa que, no futuro, as missões da Nasa rumo a asteroides irão se concentrar na defesa planetária, não na aquisição de mais conhecimentos para a ciência?
“Estamos muito interessados em ambos e esta é uma parceria muito boa”, afirma Fast. “O escritório de coordenação da defesa planetária da Nasa fica na divisão de ciência planetária porque existe muita ciência dos asteroides envolvida.”
“Queremos proteger o planeta, mas também queremos estudar estes restos incríveis da formação do Sistema Solar, para entender a história do sistema e para observar quais poderão ser os efeitos de um possível impacto – ou para o caso de precisarmos desviar algum deles no espaço.”
Probabilidade de impacto, locais da possível queda: tudo sobre o asteroide 2024 YR4
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