Em reparação histórica, acordo emergencial para compra de áreas indígenas é homologado no Paraná


R$ 240 milhões de Itaipu serão destinados para compra de pelo menos 3 mil hectares para indígenas que vivem em áreas de conflitos. Instituições também deverão publicar pedido público de desculpas aos indígenas pelos danos causados na construção da usina. STF homologa acordo de reparação histórica a comunidades indígenas
Foi homologado nesta segunda-feira (24) em Itaipulândia, no oeste do Paraná, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o acordo emergencial para a destinação dos R$ 240 milhões de Itaipu para compra de três mil hectares de terra para os indígenas Avá-Guarani das Terras Indígenas Tekoha Guasu Guavira e Tekoha Guasu Okoy Jakutinga.
O documento foi assinado por Itaipu Binacional, em conjunto com a União, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Ministério Público Federal (MPF) e pela Comissão Guarani Yyrupa, que representa os indígenas.
“A ação, movida pelo procurador-geral da República, busca a reparação de danos materiais e morais causados às comunidades Avá-Guarani pela construção e instalação da Usina Hidrelétrica de Itaipu”, disse em nota a usina, em referência ao acordo.
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As áreas serão destinadas a 31 comunidades situadas nas terras indígenas Tekoha Guasu Guavirá e Tekoha Guasu Okoy Jakutinga, distribuídas em São Miguel do Iguaçu, Itaipulândia, Santa Helena, Terra Roxa e Guaíra, onde vivem aproximadamente 5,8 mil pessoas.
A tratativas do acordo foram mediadas pela Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF/AGU), a pedido do ministro Dias Toffoli, relator de Ação Cível Originária, movida pela Advocacia-Geral da União (AGU), e que está em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF).
Para o acordo, chamado de emergencial porque “equilibra as necessidades urgentes das comunidades indígenas com a viabilidade prática de aquisição de terras no curto prazo”, segundo Itaipu, foram realizadas mais de 20 reuniões, ao longo dos últimos dois anos, com as instituições envolvidas.
O acordo também prevê, entre seus principais pontos, que dentro de 15 dias, Itaipu, Funai e União publiquem pedido público de desculpas ao Avá-Guarani, pelos danos causados na construção da usina, reconhecendo as responsabilidades da empresa. O pedido deverá ter detalhes dos fatos históricos que levaram a violação dos direitos das comunidades indígenas afetadas com a construção da usina.
“A Itaipu tem 51 anos de idade, então é um pedido de desculpa bastante antigo. Ele tem que ser ecoado em todo o planeta, que é o Brasil, Itaipu, reconhecendo que a terra dessa comunidade indígena lhes foi tirada, e é preciso que lhes dê condição de vida. Por exemplo: quem mora aqui na região onde nós estamos, recebe os royalties, porque a água invadiu sua terra. Eles recebem anualmente um bom valor por isso e os indígenas não receberam. Esse período todo não lhes foi dado o direito, nem garantias em troca daquilo que eles tinham ,que era seu lar”, disse o diretor -geral brasileiro da Itaipu, Enio Verri.
Em nota, a Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep), questionou o acordo e alegou que as discussões não envolveram representantes do setor.
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R$ 240 milhões de Itaipu serão destinados para compra de terras para indígenas que vivem em áreas de conflitos.
Alexandre Marchetti/Itaipu Binacional – Divulgação
Histórico de conflitos resulta em acordo emergencial
O início do conflito remete à construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, entre os anos de 1973 e 1982.
Na escolha do local para a construção da usina, houve a retirada de indígenas dos locais de interesse e a hidrelétrica inundou 135 mil hectares de terras cultivadas e terras originariamente ocupadas por indígenas, segundo o relatório final da Comissão Estadual da Verdade do Paraná.
Além de serem retirados dos locais onde viviam, espaços sagrados, como cemitérios, as casas de reza e o maior conjunto de cachoeiras do mundo em volume de água, o Salto de Sete Quedas, foram submergidos por conta da construção de Itaipu.
Desde o começo dos anos 2000, o grupo indígena reivindica por terras. Em 2018, a Funai delimitou um território para a criação da terra indígena “Tekoha Guasu-Guavirá”. São mais de 24 mil hectares e nos últimos anos, os guaranis fizeram pelo menos sete acampamentos dentro da área.
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De acordo com o estudo da Funai, o território dos indígenas, chama os espaços de “retomadas”. Para os agricultores, foram invasões, já que eles possuem o documento da terra. A partir disso, iniciaram os conflitos.
Por isso da emergência nas tratativas, especialmente pelo risco a que estão expostos os indígenas que vivem em constantes conflitos com agricultores da região. Em um dos casos recentes, o indígena Avá-Guarani Doroteu Martines Jara, de 25 anos perdeu movimentos do corpo ao ser baleado.
Além da integridade física, parte dos indígenas também convive com outras sérias violações aos direitos humanos, como a insegurança alimentar. Um estudo recente do Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial da Defensoria Pública do Paraná (DPE-PR), por exemplo, mostrou que 90% do indígenas quem vivem na comunidade em Guaíra não tem seguridade alimentar.
O que prevê o acordo
O acordo prevê que a escolha das áreas será feita pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), “em acordo com os próprios indígenas e seus representantes legais”.
Após esta etapa, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) será responsável pela avaliação das terras, juntamente com servidores da Justiça Estadual ou Federal cabendo a Itaipu apenas o pagamento pelos imóveis.
“As terras serão adquiridas em nome da União e destinadas às aldeias indígenas, assegurando seus direitos territoriais como compensação pelos danos históricos sofridos”, disse Itaipu em nota nesta segunda (24).
Além da aquisição de terras, o acordo estabelece diversas medidas para garantir os direitos sociais e culturais do povo Avá-Guarani, como por exemplo, acesso aos serviços básicos de moradia, água potável, energia elétrica, saneamento básico, saúde e educação.
O documento também prevê o desenvolvimento de projetos de segurança alimentar e nutricional, além do fortalecimento cultural das comunidades.
“A Itaipu, desde que foi construída, tinha essa dívida social com as comunidades indígenas. Portanto, esses recursos para aquisição dos 3 mil hectares é parte do pagamento. Por que é parte? Porque nós temos outros compromissos. Não basta apenas dar a terra, é importante dar assessoria técnica, acompanhamento, tanto que nós já temos um projeto que trabalha diretamente com o acompanhamento dessas comunidades. A ideia é que assim que elas forem alocadas no seu devido espaço ,a itapu esteja presente, lhe dando condições de melhorar a sua qualidade de vida”, complementou Verri.
Com relação às áreas compradas, Itaipu também ficará com a responsabilidade de implementar ações de restauração ambiental nas áreas a serem adquiridas.
“Sendo premissa inafastável a participação das comunidades no planejamento dessas ações, bem como o respeito às suas formas de organização social, conforme seus usos, costumes, línguas e tradições”, diz trecho do documento.
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