
Milton Nascimento no palco do II Festival Internacional da Canção, transmitido pela TV Globo em outubro de 1967
Reprodução / Facebook Milton Nascimento
♫ MEMÓRIA
♪ A foto acima flagra Milton Nascimento em outubro de 1967 no palco armado no ginásio carioca Maracanãzinho para a transmissão da segunda das sete edições do Festival Internacional da Canção, popularmente chamado de FIC. Então ainda desconhecido, Milton levou o prêmio de Melhor intérprete do festival e viu a canção Travessia – a primeira composta por ele com o parceiro letrista Fernando Brant (1946 – 2015) – abocanhar o segundo lugar no festival.
Foi o primeiro FIC transmitido pela TV Globo (a primeira edição foi veiculada em 1966 pela TV Rio, emissora já extinta). Ali, ao projetar a imagem e a voz vitoriosa de Milton Nascimento para todo o Brasil, a emissora carioca – inaugurada em 26 de abril de 1965, há exatos 60 anos – começou a (ajudar a) escrever da música brasileira.
Essa história ganhou capítulos emocionantes a partir de 1969, quando a Globo começou a produzir trilhas sonoras para as novelas. A primeira trilha original foi a de Véu de noiva, trama que inaugurou a era das novelas naturalistas, ambientadas no Brasil.
A partir dos anos 1970, as trilhas de novelas amplificaram músicas e cantores, a ponto de gerar modismos e movimentos. Em 1974, já entronizado no posto de cantor mais popular do Brasil, Roberto Carlos entrou para o elenco da emissora para apresentar especial de fim de ano que se tornaria tradição no Natal do povo brasileiro por 50 anos.
Em 1975, ano que a Globo revelou Djavan no festival Abertura (tentativa vã de reviver a efervescência da era dos festivais dos anos 1960), a trilha sonora da novela Gabriela projetou o mesmo Djavan e também a voz de Gal Costa (1945 – 2022), cantora cultuada desde 1967 em nichos de contracultura, mas ainda sem uma real popularidade nacional da dimensão do canto cristalino.
Um ano depois, em 1976, a trilha de Anjo mau projetou Guilherme Arantes e a trama e a trilha da novela Estúpido cupido (1976 / 1977) conseguiram a proeza de revitalizar as carreiras dos cantores que inauguram o universo pop brasileiro, a partir do binômio 1958 / 1959, com rocks que abriram alas para o surgimento da Jovem Guarda em 1965. Intérprete da música-título da novela, a então já esquecida Celly Campello (1942 – 2003) ficou novamente popular.
Em 1978, foi a vez de a novela Dancin’ days popularizar a disco music no Brasil em nível massivo, a ponto de cantores de outros estilos, como Gilberto Gil e Ney Matogrosso, terem flertado com o som cintilante das discotecas. Em 1980, o diretor Daniel Filho estreitou os laços da Globo com a MPB ao criar a série Grandes nomes, composta por especiais comandados por um único artista, com direito a convidados estelares no palco e na plateia.
Os programas de Elis Regina (1945 – 1982) e Rita Lee (1947 – 2023) se tornaram antológicos. Até o arisco João Gilberto (1931 – 2019) deu as caras. Naquela altura, ter uma música em trilha de novela da TV Globo já simbolizava o passaporte imediato para o sucesso em todo o Brasil.
Quase todos os grandes ídolos da MPB, como Caetano Veloso e Maria Bethânia, foram favorecidos pela exposição nessa vitrine sonora nacional, ampliada quando o apresentador Abelardo Barbosa (1917 – 1988), o Chacrinha, voltou para a Globo em 1982 para comandar o Cassino do Chacrinha, programa fundamental para a veiculação de músicas ao longo dos anos 1980.
Foi nessa década que, precisamente em 1986, o mesmo Daniel Filho da série Grandes nomes criou o programa Chico & Caetano, importante inclusive por trazer o então refratário Chico Buarque para a tela da TV Globo. O programa marcou época pelos encontros dos dois anfitriões com convidados como Cazuza (1958 – 1990) e Mercedes Sosa (1935 – 2009).
Merecem ainda menções honrosas nos anos 1980 as trilhas sonoras blockbusters das novelas Roque Santeiro (1985) e Tieta (1989), ambas com várias músicas compostas para as respectivas tramas.
A partir da década de 1990, a Globo entrou no circuito sertanejo, percebendo a força dessa música em todo o Brasil. O especial Amigos – com Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo e Zezé Di Camargo & Luciano, então as três duplas sertanejas mais populares do país – abriu a porteira por onde ainda entram desdobramentos como o recente especial Amigas, atração de 2024 com foco no feminejo.
Da era dos festivais ao universo sertanejo, passando por Roberto Carlos, pela MPB, pelo apogeu da axé music e pelo samba, a TV Globo deu contribuição relevante para a propagação da música brasileira ao longo desses 60 anos, criando uma história que ainda ganhará muitos novos capítulos pelas próximas décadas.