Ex-comandante da Marinha confirma reunião com Bolsonaro, mas nega ‘minuta’ ou ter colocado tropas ‘à disposição’ do golpe


Almir Garnier é o terceiro dos oito réus do chamado ‘núcleo crucial’ do golpe a prestar depoimento. Jair Bolsonaro deve ser ouvido ainda nesta semana. Ex-comandante da Marinha confirma reunião com Bolsonaro, mas nega ‘minuta do golpe’
O ex-comandante da Marinha brigadeiro Almir Garnier Santos confirmou à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, nesta terça-feira (10), que participou de uma reunião no Palácio da Alvorada, em 7 de dezembro de 2022, na qual se discutiram medidas de “garantia da lei e da ordem”.
Essa é a data em que, segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), o então presidente Jair Bolsonaro discutiu uma minuta de decreto golpista com os comandantes do Exército e da Marinha, além do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.
“Havia vários assuntos [na reunião de 7 de dezembro], o principal era a preocupação que o presidente tinha, que também era nossa, das inúmeras pessoas que estavam, digamos assim, insatisfeitas e se posicionavam no Brasil todo, em frente aos quartéis do Exército”, afirmou Garnier.
“Houve uma apresentação de alguns tópicos de considerações que poderiam levar a talvez – não foi decidido isso naquele dia – à decretação de uma GLO ou necessidades adicionais, principalmente visando a segurança pública”, disse.
Questionado, Garnier negou ter recebido algum documento que pudesse ser considerado uma “minuta golpista”.
“Eu não vi minuta, ministro. Eu vi uma apresentação na tela do computador. Havia um telão onde algumas informações eram apresentadas. Quando o senhor fala minuta, eu penso em papel, em um documento que lhe é entregue. Não recebi.”
Garnier também negou que tenha colocado as tropas que comandava “à disposição de Bolsonaro” para uma ruptura democrática.
A acusação foi feita, ao longo da investigação, pelo ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior.
“Senhor ministro, como lhe disse, não houve deliberações nem do presidente, não abriu a palavra. Ele fez as considerações dele, expressou o que parecia pra mim preocupações Ideias do que alguma coisa em alguma direção”, disse Garnier.
Ex-comandante da Marinha Almir Garnier em depoimento ao STF
TV Justiça/Reprodução
Em que fase está o julgamento?
Os depoimentos marcam a reta final da instrução processual — fase em que são reunidas provas para embasar o julgamento. É nesse momento que os réus têm a chance de responder às acusações e apresentar suas versões dos fatos.
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), o grupo integra o “núcleo crucial” da organização criminosa que atuou para tentar romper a ordem democrática. Entre os réus está o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Concluída a fase de interrogatórios, o processo segue para uma etapa de diligências, caso sejam solicitadas por defesa ou acusação. Depois, será aberto o prazo de 15 dias para apresentação das alegações finais, antes de o caso ser levado a julgamento na Primeira Turma do STF.
Primeiro dia de depoimentos
O interrogatório começou com Mauro Cid, que fechou acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal. Ele confirmou a veracidade da denúncia da PGR e declarou: “Presenciei grande parte dos fatos, mas não participei deles”.
Cid negou ter sido coagido e reafirmou o conteúdo de seus depoimentos anteriores. Segundo ele, Bolsonaro teve acesso e sugeriu mudanças à chamada “minuta do golpe” — documento com medidas autoritárias para reverter o resultado das eleições de 2022.
Ainda de acordo com o militar, Bolsonaro pediu a retirada do trecho que previa a prisão de autoridades, mas manteve o item que determinava a detenção do ministro Alexandre de Moraes. Cid também afirmou que o então presidente pressionou o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, por um relatório crítico às urnas eletrônicas.
Questionado por Moraes, Cid confirmou que Bolsonaro queria um texto “duro” contra o sistema de votação.
O segundo a ser ouvido foi o deputado Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin. Ele disse que o documento em que questiona o resultado das eleições era apenas um rascunho pessoal e não foi entregue a Bolsonaro. Também negou envolvimento na disseminação de desinformação e rechaçou ter usado a Abin para monitorar autoridades:
“Decerto que não fiz monitoramento de autoridades”, afirmou.
Em interrogatório, Mauro Cid afirma que Bolsonaro recebeu, leu e alterou a chamada minuta do golpe
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Reta final
A fase de instrução é destinada à coleta de provas. Durante o mês de maio, o STF ouviu testemunhas de defesa e acusação. Agora, os réus têm a palavra.
Neste momento, os acusados ainda não foram condenados nem absolvidos. Isso só ocorre após o julgamento. A defesa pode permanecer em silêncio — direito garantido por lei, sem prejuízo ao processo.
Participantes da audiência
Conduz as sessões o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso. Ele faz as primeiras perguntas aos réus, seguido pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, e, depois, pelos advogados de todos os acusados.
As perguntas do Ministério Público e da defesa são intermediadas por Moraes, conforme prevê o Código de Processo Penal.
Ordem dos depoimentos
Mauro Cid abriu a rodada de interrogatórios por ser delator. Os demais réus são ouvidos em ordem alfabética. Também já prestou depoimento Alexandre Ramagem. Ainda devem ser ouvidos:
Almir Garnier, ex-comandante da Marinha
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça no governo Bolsonaro
Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional
Jair Bolsonaro, ex-presidente
Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa do governo Bolsonaro
Walter Braga Netto, ex-ministro do governo Bolsonaro e candidato a vice na chapa para a reeleição do ex-presidente.
Próximos passos
Encerrados os interrogatórios, defesa e acusação poderão solicitar diligências complementares. Em seguida, será aberto o prazo de 15 dias para as alegações finais — documento em que as partes resumem suas teses e apresentam argumentos pela condenação ou absolvição.
Depois disso, o processo poderá ser pautado para julgamento na Primeira Turma do STF. O colegiado decidirá o destino dos réus: condenação (com fixação das penas) ou absolvição (com arquivamento). Ambas as decisões são passíveis de recurso dentro do próprio Supremo.
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