Tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de Ordens do então presidente Jair Bolsonaro (PL), durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), em Brasília, nesta quinta-feira, 24.
WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO
O Brasil tem precedentes recentes de “desabafos gravados” e escondidos de delações premiadas – como o que agora atinge o coronel do Exército Mauro Barbosa Cid. O caso de maior repercussão, nos últimos anos, foi o do executivo Joesley Batista, da J&F.
Assim como Mauro Cid, ele fechou delação premiada. E assim como Cid, foi flagrado em gravação dizendo coisas graves que deveriam constar nos depoimentos, mas tinham sido omitidas.
Em 2017, Joesley entregou um pendrive à Procuradoria-Geral da República (PGR) que revelava uma conversa dele com o então diretor jurídico da J&F, Ricardo Saud, com teor criminoso. O tema deveria ter constado em sua delação.
Frente à descoberta do diálogo, a PGR pediu a prisão de Joesley e a rescisão do acordo, o que foi acatado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Relembre:
Fachin derruba sigilo das gravações de Joesley que causaram reviravolta na delação da JBS
O caso de Cid é ligeiramente diferente – em vez de omitir dados, o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro foi flagrado em áudios revelados pela revista Veja acusando a investigação.
O ponto de contato entre as duas histórias? Em ambos os casos, a lei prevê a rescisão da delação premiada.
Um delator não pode mentir nos depoimentos – e também não pode confessar sob suspeita de pressão ou manipulação.
Até o momento, não é possível saber em qual contexto Mauro Cid fez as afirmações registradas nos áudios divulgados pela Veja. A defesa diz que foi um “desabafo” e que discorda do conteúdo – ou seja, nega que tenha havia irregularidades na condução da delação premiada.
O fato é que, agora, Cid e sua delação estão na berlinda. Seja porque as acusações são música aos ouvidos de bolsonaristas interessados em lançar dúvida sobre a delação; seja porque desabafou, ou por qualquer outro motivo que tenha levado às declarações.
Como delator, Cid jamais poderia comentar o contexto e os termos da delação com outros interlocutores que não têm acesso ao material. Ao fazer isso, violou o sigilo dos termos da delação – desrespeitando mais uma regra.
Os áudios foram revelados nesta quinta (21), e Cid deve ser ouvido sobre as revelações nesta sexta (22). Tudo indica que ele pagará pelas declarações. A lei é bastante clara: um delator tem benefícios, mas também tem responsabilidades.